Prioridade para medidas para gerar emprego e renda deixa de lado o pacote anticrime do ministro da Justiça
Rodolfo Costa/Site Estado de Minas
Postado em 12/08/2019 06:00 / Atualizado em 12/08/2019 09:26
A imagem da capa do site Multisom foi retirada de arquivos da internet/Google
Brasília – A economia escanteou o ministro da Justiça, Sérgio Moro. O presidente Jair Bolsonaro até tenta blindá-lo, mas não convence.
Na sexta-feira, fez afagos, mantendo-o ao lado em declarações à imprensa e em uma cerimônia militar, e desconversou sobre a declaração dada na quinta-feira, de que daria uma “segurada” no pacote anticrime. No entanto, ficou nítido que os gestos não sustentam o fortalecimento de Moro no sábado, quando o governo afirmou que enviará ao Congresso nas próximas semanas uma proposta de capitalização na Previdência.
A leitura que especialistas e parlamentares começam a fazer é de que a pressão por melhores resultados de geração de emprego e renda está obrigando o governo a postergar a agenda de segurança pública. O que surpreende é a naturalidade como isso está sendo conduzido.
Quando a gestão se constituiu, o ministro era uma das peças chaves e, de certa forma, emprestou sua credibilidade ao então governo em formação pelo papel que exerceu enquanto juiz que condenou, em primeira instância, figurões da política presos na Operação Lava-Jato nos processos de Curitiba.
Agora, com a imagem carimbada pelas reportagens do The Intercept, que levantam suspeitas sobre a suspeição e imparcialidade de decisões tomadas nos processos da Lava-Jato, o jogo inverteu. É Bolsonaro quem está emprestando o capital de credibilidade a Moro, analisa o cientista político Geraldo Tadeu, professor e coordenador do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas sobre a Democracia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).
É aí que a atividade econômica entra como um impulsionador no clima de escanteamento de Moro. “Mais do que nunca, Bolsonaro sente que precisa da economia para gerar efeitos positivos para ele, e coloca a agenda do (Paulo) Guedes (ministro da Economia) em evidência. O presidente se sente forte politicamente para não necessariamente dispensar a figura do ministro, mas para colocá-lo em um patamar abaixo, à condição de um mero auxiliar, não mais como uma superestrela do governo”, analisa Tadeu. “Vai caber a Moro aceitar essa condição ou não. Agora, ele literalmente está na mão do Bolsonaro”, acrescenta.
O termo “estar nas mãos” é bastante subjetivo, mas, entre quinta e sexta-feira, Bolsonaro não poupou Moro de recados e declarações, por vezes, constrangedoras. Na tradicional “live” em uma rede social, o capitão reformado fez uma brincadeira com conotação sexual, questionando se o titular da Justiça faria um “troca-troca” com o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, ao sair da bancada. O presidente disse, ainda, ser o “técnico do time de futebol”, e que Moro é um “jogador”. Frisou, ainda, que Moro “não tem poder, não julga mais ninguém”, sugerindo que ele, como qualquer outro ministro, deva entender o seu papel no governo.
Estratégia Politicamente, a estratégia de Bolsonaro não é equivocada. No Parlamento, a articulação política do governo foi avisada que a atual gestão não será tratada de maneira diferente em relação às anteriores. “Um governo é forte no primeiro ano. No segundo ano, sem apresentar resultados para o estar socioeconômico, começa a perder o capital político. Bolsonaro está alertado disso”, declara um líder partidário, sob condição de sigilo. Dar estímulos aos agentes econômicos mantendo a agenda econômica como prioritária se mostra, dessa forma, uma estratégia coerente.
A aposta nos projetos econômicos não significa, entretanto, que Guedes estará em um patamar acima dos demais ministros. No pós-Previdência, líderes partidários estão se mobilizando para pressioná-lo ao máximo. A tática é atingir o governo em cheio para testar até onde Bolsonaro está disposto a mudar o relacionamento com o Congresso.
“Nós vamos pressionar Paulo Guedes o máximo que pudermos. Ou ele apresenta alguma coisa, ou pede demissão”, declara o líder. Não há um consenso entre as lideranças nesta estratégia, mas há um grupo majoritário composto por MDB, PSDB, DEM, PSD, PRB, PP, PL e outros partidos menores.
O próprio projeto de capitalização será um grande desafio ao governo. Lideranças não se mostram muito amistosos com a ideia. O líder do Podemos na Câmara, José Nelto (GO), defende que, primeiro, seja feita uma reforma no sistema financeiro – com abertura do mercado para atrair os principais bancos estrangeiros e fornecer ampla concorrência –, para, depois, discutir a matéria. “Capitalização sem abertura do mercado financeiro é para agradar os banqueiros brasileiros”, critica.